Cooperativa de Consumo de Barcarena

A Cooperativa de Responsabilidade Limitada, Sociedade de Crédito e Consumo do Pessoal da Fábrica da Pólvora de Barcarena foi fundada em 22 de Outubro de 1895, por Joaquim Nunes da Matta, um capitão de artilharia e Júlio José de Carvalho, com o capital social de 500$000 reis, cujos estatutos foram registados no notário Camilo José dos Santos Júnior e publicados no Diário do Governo nº 291 de 23 de Dezembro do mesmo ano, com escrituras adicionais, que respeitam à alteração deste documento de 17 de Janeiro de 1916 no notário Ferreira de Carvalho, a 4 de Julho de 1925 pelo notário Evaristo de Carvalho e finalmente a 20 de Agosto de 1955, tendo sido notário Facco de Viana, tratando-se de uma estrutura associativa de muito valor criada na sede da freguesia ao serviço do pessoal daquela empresa.
A Cooperativa que apareceu com esta nomenclatura, passou depois, em meados dos anos cinquenta, a ser conhecida pela "Cooperativa de Consumo "A Familiar" de Barcarena, na última alteração do seu regulamento.
Curiosos, são os textos que regiam os estatutos desta cooperativa, pois "as mulheres casadas", para serem associadas, "carecem de autorização escrita de seus maridos, e os menores de 21 anos de seus pais ou tutores, autorização que será lançada na respectiva proposta".
A Cooperativa possuía ainda importantes finalidades sociais, pois "tinha como fim fabricar, adquirir, e fornecer aos seus associados os artigos necessários para o seu consumo", ou ainda, "adquirir ou mandar construir casas, ou quaisquer outras instalações, fazer empréstimos de dinheiro aos sócios, funcionando um regime de cadernetas e senhas", pois a Cooperativa, actuando neste espírito solidário, foi considerada durante largos anos e nas palavras de muitos associados antigos, "uma verdadeira mãe". A Cooperativa, já com a nomenclatura de "A Familiar", para mais facilidades e comodismo proporcionar aos seus associados, abriu uma sucursal na própria Fábrica, na década de sessenta, altura em que a empresa registou um maior número de funcionários, tendo atingido cerca de seiscentos, funcionado até ao seu encerramento, igualmente em 1988.
Tal qual muitas outras associações similares no país, a Cooperativa surgiu em finais do século XIX, como uma estrutura cooperativista, influenciada pelo grande movimento revolucionário que se gerara em Portugal durante o reinado de D. Luís pelos grupos liberais liderados por altas individualidades, especialmente ligadas à literatura, que lutaram em defesa do proletariado, criando mesmo uma grande e importantíssima onda de apoio e ajuda solidária.
Aos poucos, os trabalhadores foram saindo do enorme marasmo e exploração a que vinham sendo sujeitos pelo patronato, colocando já as suas reivindicações, proporcionando greves e dando um pouco de mais ordem às leis laborais, embora longe de alcançarem o nível existente na maioria das empresas da Europa evoluída e já democratizada .
Também estes grupos que funcionavam na rectaguarda em Portugal, influenciados pela "Comuna de Paris" acabaram por dar força à grande onda de greves que se espalhou pelas fábricas do país, na década de setenta desse mesmo século.
A Cooperativa de Barcarena, apareceu como uma regalia para o povo barcarenense, tal qual outras estruturas criadas na altura na freguesia, como o Associação de Socorros Mútuos que dava consultas médicas duas vezes por semana pelo clínico Dr. Borges de Almeida entre outros, tendo, inclusivamente, funcionado até aparecer a Segurança Social, e era uma estrutura social que zelava pelos funcionários, instalada na actual travessa do Rio, naquela época mais conhecida pela "Travessa dos Revoltosos", por morarem ali algumas pessoas ligadas às políticas de esquerda.
Foi criada também uma Farmácia que dava apoio aos necessitados de medicamentos, e pensou-se seriamente num jornal local, que informasse a população dos vários problemas existentes na época, o "Eco de Barcarena", só que este apenas se publicou por uma única vez.
O jornal que se dizia ser, do pessoal da Fábrica da Pólvora de Barcarena, publicou-se em 1 de Maio de 1918, dia do trabalhador, cujo director e editor era Júlio da Silva Rego, tendo a sua administração e redacção, no Largo Rodrigues de Freitas nº 22 em Barcarena.
Apenas teve uma única edição, não se sabendo bem porque razão, mas certamente por imposição da chefia da própria fábrica, ou falta de verbas para a sua continuidade, mas outros apareciam na localidade, como "A Guitarra", portador de notícias que favoreciam os trabalhadores e que o António Louro se encarregava de distribuir pelos trabalhadores da Fábrica da Pólvora e ainda a "Gazeta de Oeiras", mas com outro estatuto editorial e obviamente, com características mais generalistas.
Também fora criado o "Grémio" que servia a população, situado junto à capela de S. Sebastião e que vendia rações, produtos ligados à agricultura entre muitas outras coisas, estruturas todas elas ligadas e concebidas quase na sua totalidade, para servir o pessoal da Fábrica da Pólvora de Barcarena.
Todo este movimento vanguardista que se instalou em Barcarena nos finais do século XIX, que foi funcionando com regularidade e eficácia, viria a motivar algumas preocupações, anos mais tarde, ao Governo de António Oliveira Salazar, na década de trinta do século XX, causando mesmo várias detenções, onde se incluiu João de Melo, Maximiano Pinheiro, António da Silva, Júlio da Silva Rego, Felner Duarte, Serafim Nogueira, José Ferreira entre muitos outros.
Mas antes, no final do século XIX, em plena monarquia e atendendo à grande abertura consentida pelo rei D. Luís, todas estas estruturas foram criadas para apoio dos trabalhadores e Barcarena, embora um pouco tarde, talvez por ter tido dificuldades de organização por se tratar de uma freguesia pequena, só nos últimos anos do século despertou para esse desenvolvimento associativo e cooperativista, pois, reconheça-se, que se vivia com uma enorme euforia em Barcarena, já que ela iniciou-se com a junção de um punhado de pessoas que formaram um "cavalinho" musical, passando depois a um grupo organizado denominado "Sol & Dó", que se reunia numa casa em Barcarena, sem condições, no ano de 1880.
Só mais tarde é que apareceu a sede e o quartel dos actuais "soldados da paz", dando origem à corporação de bombeiros e mesmo assim este uniu-se, devido a um grande incêndio que deflagrou num barracão que existia mesmo no centro de Barcarena, reconhecendo-se nesse próprio dia a necessidade de se formar uma associação de bombeiros que assim aconteceu, dirigida inicialmente por um padre.
Essa associação foi criada, juntou-se ao grupo musical já existente e fundado em 1880, recebendo a nomenclatura de Associação de Bombeiros Voluntários Progresso Barcarenense, que passou a funcionar com as duas vertentes, humanitariamente com o seu serviço de incêndios e a colectividade que, desenvolvia actividades culturais e recreativas, como teatro, danças etno-folclóricas, música e bailes, divertindo assim o povo.
O movimento era entusiasmante, mas nem sempre se iam encontrando pessoas para ocupar os cargos que todas estas profícuas e fundamentais estruturas, careciam para o grande desenvolvimento político, associativo, económico e social que o país atravessava.
Por todo o lado despontavam novas fábricas e isto porque as estradas e o caminho-de-ferro estavam em franco desenvolvimento e grande crescimento, permitindo de dia apara dia, melhores acessos, mais fáceis deslocações, o que não era possível até ali.
A Cooperativa apareceu nessa altura e de imediato começou a desenvolver um excelente trabalho servindo os seus associados, inicialmente, apenas funcionários da Fábrica da Pólvora, como os seus estatutos o atestam no Artigo 2º.
"Esta sociedade é composta por ilimitado número de sócios de ambos os sexos e de todas as profissões, que façam parte do pessoal da Fábrica da Pólvora de Barcarena e bem assim os reformados e pensionistas".
Eram admitidos também "os filhos, irmãos e netos de ambos os sexos dos sócios existentes ou falecidos, empregados na Fabrica da Pólvora de Barcarena, com mais de dois anos de associados e bem assim os maridos das sócias existentes".
Também havia uma abertura para "as viúvas dos sócios, enquanto não mudarem de estado civil".
Mais tarde em 20 de Agosto de 1955, no notário Facco Viana, os estatutos foram de novo alterados passando a ter a nomenclatura de Cooperativa de Consumo "A Familiar" de Barcarena, podendo então ser admitida qualquer pessoa, mesmo sem ser funcionária da Fábrica da Pólvora, dada as suas carências e dificuldades de sobrevivência, pois era necessário realizar fundos e sobretudo escoar as mercadorias que se encontravam em "stock".
Na data da sua fundação, a cooperativa, começou apenas por vender carvão, petróleo, pão e vinho, possuindo uma reduzida acção comercial, contudo a venda daqueles combustíveis foi o principal motivo para o seu arranque, já que eram produtos de difícil aquisição e as pessoas para os adquirir, sujeitavam-se a grandes filas de espera e mesmo assim, cada um não levantava o que bem queria e necessitava.
No comércio externo, havia racionamento e isso era complicado, pois as pessoas necessitavam de fazer as suas refeições e por muito modestas que fossem naquela época, não tinham combustível, acabando muita gente, por recorrer aos métodos antigos, de recolha de cascas de eucalipto, bóstias de gado e trancos de árvore para manterem os lumes.
A Cooperativa quando apareceu estava predestinada a colmatar todas essas carências e através da Fábrica da Pólvora esses produtos não faltavam, nem sequer eram racionados, pois qualquer empregado os adquiria com relativa facilidade, mas também era preciso não haver abusos, já que muitos compravam porções a mais para dispensar aos amigos e alguns com ganhos extras, o que acabou por ser contestado pelos empregados e reprimidos os casos que iam sendo detectados.
Entretanto, Barcarena foi assolada por uma grande epidemia que causou a morte a muita gente, pois era rara a família da terra que não via desaparecer quase diariamente um seu parente.
A "pulmónica", que surgiu nos primeiros anos do século XX, abalou um pouco as estruturas sociais barcarenenses, mas mesmo assim, e com grandes dificuldades, conseguiu-se superar esse surto, motivado pela grande falta de higiene, pois não havia saneamento básico e os dejectos caseiros eram atirados para fossas e esterqueiras, acabando por ser canalizados para a ribeira de Barcarena, que corria quase dentro da povoação e daí ter poluído de forma quase total a população, que viu desaparecer nesse período negro da localidade, algumas importantes figuras da terra, assim como dezenas de moradores, enlutando grandemente todo o povo.
A Associação e Socorros Mútuos, que as pessoas se habituaram a rotular de "Montepio", situado onde hoje se encontra a sede do partido Socialista em Barcarena, teve uma acção bastante eficaz nesse terrível tempo, mas incapaz de travar imediatamente o surto que durou algum tempo.
A Cooperativa ajudou todas essas famílias num gesto de solidariedade, facilitando o pagamento das suas contas, já que a maioria ficara arrasada com as despesas, numa tentativa desesperada de salvar os seus familiares, sofrendo as consequências económicas de tão brutal e mortífero surto.
Só uns anos mais tarde é que abandonou algum marasmo que vinha sofrendo, ampliando as suas instalações, fazendo obras no edifício, acrescentando o seu balcão, passando a vender outro tipo de produtos, ou seja, tudo do ramo alimentar e ainda roupas, louças e artigos de outras espécies, que embora não existissem nas suas instalações em Barcarena por falta de espaço e condições, a direcção passava requisições para ser adquiridos em Lisboa nas diversas lojas da especialidade, com quem mantinha contratos de venda.
Teve uma acção importantíssima durante os períodos de guerra, não só a que rebentou em 1914 e duraria até 1917, como a Guerra Civil de Espanha de 1936 a 1939, que teve repercussões gravosas no nosso país e ainda a II Guerra Mundial que durou desde 1939 a 1945, pois nesses períodos de grandes carências, turbulências várias, falta de géneros, obrigaram as pessoas a viver com grandes dificuldades, com alguns a atingirem mesmo os limites da sobrevivência.
Foi a Cooperativa, nessa altura, o grande celeiro do povo barcarenense, pois nada faltou aos seus sócios e isso foi fundamental para uma regular vivência de toda a gente.
Funcionava com uma mesa de Assembleia-geral, composta por um presidente e dois secretários, havendo portanto todos os anos eleições para eleição dos seus corpos gerentes e era a direcção, formada por um presidente, dois secretários, um tesoureiro e cinco vogais que determinava o que fazer, assim como aprovava os sócios, indicava os fornecedores, mas era a "Comissão de Compras" que se encarregava de adquirir todos os artigos de consumo, na maioria o próprio Estado, e zelar pela conferência de pesos, qualidade, enviando depois as facturas para a direcção.
O Conselho Fiscal, composto por um presidente um secretário e um relator, conferia as contas.
Se existiam estruturas sociais importantes em Barcarena, a Cooperativa de Crédito e Consumo era talvez a que mais interessasse a todos os trabalhadores da Fábrica da Pólvora e suas respectivas famílias, hoje transformada num fantasma do passado, mas consciente por ter dado de comer a muita gente em anos de angústia e sofrimento no nosso país.
Teve uma enorme acção social, pois apareceu sempre como um Deus celestial, precisamente em épocas conturbadas do país, pois se a passagem da monarquia para o regime republicano, trouxe alguns embargos e carências, uns anos mais tarde, seria a grande anarquia existente no país a prejudicar o seu bom funcionamento, contudo a Cooperativa acabaria por resistir e desenvolver um trabalho profícuo garantindo os víveres aos barcarenenses que passavam dias penosos, com o estoirar do primeiro conflito mundial.
Superadas essas datas, viria de 1936 em diante a ter novamente uma função muito importante, na medida em que a guerra civil de Espanha e logo a seguir a II Guerra Mundial trazia aos portugueses e obviamente aos barcarenenses, dias de muita fome e dificuldade.
Quem tinha uns «tostões» ainda se governava, mas os trabalhadores, esses coitados, sofriam e bem, agarrados às suas produções caseiras, couves, batatas e hortaliças que criavam nas sua hortas e era à base disso a sua alimentação.
Para os mais necessitados a Cooperativa ainda emprestava dinheiro, para que cada um pudesse fazer, o melhor possível, face à sua vida.
A Cooperativa de Consumo encontrou sempre gente dedicada, que tudo fazia para que nada faltasse às pessoas associadas e mesmo quando aquela instituição sentia dificuldades nos seus cofres para poder adquirir certos produtos, havia sempre alguém que emprestava o dinheiro para que as carências fossem minimizadas.
Recordamos que muita gente, apesar de garantidos os víveres na Cooperativa, ainda passava grandes e sérias dificuldades que acabavam por criar problemas de saúde, já que também nessa área, as carências persistiam, pois bem nos lembramos ainda de certas famílias, se remediarem com quantidades irrisórias de produtos considerados essenciais, por não disporem de dinheiro e até adoçarem o habitual café da manhã com caramelos e rebuçados de fraca qualidade, por o açúcar estar racionado e haver grande falta dele.
Também o pão era comido com banha, no lugar da saborosa manteiga e ninguém dizia que não.
Em muitos lares a sopa era a base da alimentação e o conduto por vezes não havia e quando se davam ao luxo de o tragar, a batata era sempre servida em quantidade e uma sardinha, em certos lares, obrigava-se a ser repartida por duas e três pessoas.
Também o carvão era adquirido com dificuldade, pois era assim que as pessoas cozinhavam e se a Cooperativa o não tivesse, o problema agravava-se pois teriam de suportar longas bichas nas vendas oficiais do mesmo, pois em Barcarena embora houvesse quem o vendesse, encontrava-se sempre esgotado e por aqui perto somente no Cacém, junto á estação de caminho de ferro, na carvoaria do Jacob o poderiam adquirir.
Outros acabavam por se remediar com as cascas de eucalipto que colhiam junto destas árvores que abundavam dentro e fora da Fábrica da Pólvora, e ainda havia quem fizesse brasido com as bostas dos bois que nas terras de Cabanas pastavam e pela tarde eram recolhidas em sacas de linhagem e depois de secas, bem serviam para alimentar os lumes com que as dedicadas mulheres cozinhavam.
As pessoas mais idosas, que já não tinham idade para trabalhar por as forças lhe faltarem, acabavam por se levantar de madrugada, caminharem à beira da linha férrea até ao Cacém e só chegarem a casa depois da hora do jantar, pois para conseguirem um ou pouco mais quilos de carvão, obrigavam-se a intermináveis bichas, assim como ainda gente deste sector etário, após o jantar, calcorreava os eucaliptais para colherem as suas cascas, com que as suas filhas, ou elas próprias acendiam e mantinham o lume ateado.
Os associados da Cooperativa de Consumo de Barcarena, empregados da Fábrica da Pólvora, raramente tinham esse incómodo, pois nada lhes faltava, só que, apesar dessas facilidades também não abusavam nas suas solicitações, pois bem sabiam que era dificultoso todos os associados, conseguirem as quantidades necessitadas e então, havia o cuidado deles próprios se racionalizarem, porque também sabiam que o seu semelhante precisava daquele produto.
Não havia o hábito de açambarcar para em momentos de crise os satisfazer e isto porque os dinheiros não abundavam e também porque as gerências da Cooperativa, que a faziam funcionar, tinham um absoluto controlo do que vendiam e a quem forneciam os produtos, e como tal as pessoas não abusavam.
A Cooperativa tinha ainda uma grande vantagem, pois para além de vender os produtos mais baratos que nas tendas dos lugares da freguesia, atribuía juros credores aos compradores que assim, quando atingiam o final do ano e apurado o valor de gastos de cada sócio, lhes era atribuída uma importância que nessa altura era considerada muito importante.
Era um mealheiro que ali iam criando que dava sempre para comprar algo extra, ou mesmo guardarem nos cofres da instituição durante alguns anos, pois aquele dinheiro era sempre seu e sobretudo rendia juros.
A Cooperativa de Consumo passou a funcionar num edifício baixo, mesmo junto ao ribeiro na velha Travessa de Santo António em Barcarena, pois só em 1902 se conseguiu arranjar dinheiro para o adquirirem e só mais tarde ele foi completado com mais dois andares e em todos os pisos havia comércio, pois nem sequer ali faltava a carvoaria, o petróleo e a padaria que, diariamente, cozia pão de grande qualidade que era distribuído matinalmente pelos sócios que o requisitavam.
Havia mesmo um transporte puxado a muares que calcorreava toda a freguesia levando o pão aos seus habituais clientes que, de maneira nenhuma o dispensavam, mesmo sabendo-se que todo o outro que se vendia nas outras padarias particulares igualmente era de grande qualidade.
Talvez por isso, tivesse sido a última secção a resistir na velha Cooperativa, pois mais nada funcionava no degradado e depauperado edifício em 1986, que não fosse a padaria que todos os dias de madrugada perfumava as ruas da sede de freguesia, despertando assim os apetites para tão saboroso pão que ali se fabricava pelas mãos do José Maria.
Mas os dias foram-se passando o desinteresse pela Cooperativa aumentou e isto por a Fábrica da Pólvora entretanto ter encerrado e o edifício ter mergulhado em ruínas, deixando na sua gestão algumas graves mazelas, como falta de gente para a governar nas horas finais criando elevadas dívidas ao fisco que, não havendo dinheiro para as pagar, se obrigou a entrar em negociações com a Câmara Municipal de Oeiras que assumiu o pagamento dessas despesas.
A autarquia municipal tomou essa atitude, mas impôs óbvias condições, adquirir a propriedade no intuito de ali, nessa altura, serem criadas condições para um maior desenvolvimento da cultura local, só que os anos foram-se passando, as ideias não floresceram, ficando o imóvel completamente vazio, de paredes a cair, edifício destelhado, retirados alguns ancestrais valores à revelia dos seus responsáveis e hoje, qual fantasma do passado que a tanta gente matou a fome, espera que algo se faça, para que as gerações mais novas possam afinal saber o que tudo aquilo significou, porque com o esbanjamento, as facilidades em todos os aspectos e as mais diversas formas de abastecimento das pessoas de hoje, jamais entenderão essas dificuldades encontradas no passado pelos honestos e sacrificados trabalhadores que se tornaram associados da Cooperativa de Consumo de Barcarena.
A Cooperativa acabou por fechar as suas portas em 1988, mas anteriormente ainda uma comissão nomeada, por não se ter arranjado direcção, sempre a grande carência dos seus últimos anos de vida, tentou desesperadamente evitar o seu fecho e respectiva falência, pois em Março de 1986, emitiu uma convocatória apelo, a todos os associados no sentido de ser discutido o destino daquele antigo e profícuo estabelecimento cooperativista, uma vez que os aprovados estatutos não permitiam o seu legal funcionamento e então era urgente mudar, mas como nada se tivesse resolvido nessa reunião, foi sugerido que comparecessem para se decidir a sua doação.
"Não havendo elementos para constituírem os corpos gerentes e já tendo sido convocadas algumas reuniões, às quais não compareceram dez por cento dos sócios, foi sugerido que se fizesse a doação da Cooperativa à Junta de Freguesia, para que esta aproveite as instalações para fins sociais".
O regulamento obedecia a regras que os sócios não cumpriam e esta reunião, cuja comissão administrativa era composta por Vasco Henrique Monteiro Pereira, Célia Maria Santos e Maria Luísa da Costa Cabral, em nada resultou, acabando por a Cooperativa fechar definitivamente e só muito mais tarde, como havia uma série de dívidas ao fisco, se ter organizado um plenário final levado a cabo na sede dos Bombeiros de Barcarena, na presença de alguns sócios antigos, membros da Junta de Freguesia de Barcarena e Câmara Municipal de Oeiras, que determinou a entrega do edifício ao município, dispondo dele para a criação de instalações de solidariedade social, ou equivalente, desde que fosse para benefício dos barcarenenses, sob a responsabilidade da autarquia municipal liquidar as dívidas da Cooperativa, sendo presidente da Câmara nessa altura, o Dr. Isaltino Morais e assim se finou uma estrutura associativa que durou noventa e três anos, tendo sido fundamental nas grandes crises que atingiram o século XX.

 

Tercena, 24 de Agosto de 2006
Recuperado e dilatado em 18 de Novembro de 2008